Mortes Solitárias na Coreia do Sul
Todos os anos, milhares de sul-coreanos, predominantemente homens de meia-idade, falecem em silêncio e sozinhos, distantes de seus familiares e amigos. Muitas vezes, pode levar dias ou até semanas até que os corpos sejam encontrados. Essas mortes são conhecidas como godoksa, um fenômeno que representa um aspecto alarmante do crescente problema de solidão e isolamento no país. Dada a gravidade da situação, o governo está implementando diversas medidas para lidar com esse desafio.
Iniciativas do Governo de Seul
Na capital Seul, as autoridades anunciaram um investimento de 451,3 bilhões de wons (aproximadamente US$ 327 milhões) nos próximos cinco anos, com o objetivo de “criar uma cidade onde ninguém se sinta solitário”. As ações planejadas incluem:
- Conselheiros de solidão disponíveis por uma linha direta 24 horas, 7 dias por semana.
- Uma plataforma online para aconselhamento.
- Visitas e consultas presenciais como medidas de acompanhamento.
- Serviços psicológicos expandidos e criação de espaços verdes.
- Planos de refeições saudáveis para residentes de meia-idade e idosos.
- Um “sistema de busca” para identificar moradores isolados que necessitam de ajuda.
- Atividades ao ar livre, como jardinagem, esportes e clubes de leitura.
O prefeito de Seul, Oh Se-hoon, enfatizou que a solidão é uma questão que deve ser tratada coletivamente. Ele afirmou que a cidade “mobilizará toda a nossa capacidade” para ajudar aqueles que são afetados e desejam se reintegrar à sociedade.
Um Problema em Crescimento
Nos últimos anos, o problema da solidão ganhou destaque nacional, especialmente com o aumento de jovens reclusos que se distanciam do convívio social, uma situação conhecida como hikikomori. Em 2022, estima-se que a Coreia do Sul tenha registrado até 244.000 casos desse fenômeno.
O número de mortes solitárias também vem aumentando, passando de 3.378 em 2021 para 3.661 em 2022, segundo dados mais recentes do Ministério da Saúde. Essa elevação é atribuída a uma nova definição mais abrangente de “morte solitária”, que agora inclui qualquer pessoa que viva isoladamente e que venha a falecer devido a suicídio ou doença.
Outro fator a ser considerado é a crise demográfica do país, com uma população envelhecida e uma taxa de natalidade decrescente, resultando em um número maior de mortes do que nascimentos.
O Perfil das Mortes Solitárias
Um aspecto preocupante é que mais de 84% das mortes solitárias são de homens, sendo que homens com idades entre 50 e 60 anos representam mais da metade desse total, tornando-os especialmente vulneráveis.
Causas da Solidão entre os Coreanos
A solidão é uma questão global, mas os sul-coreanos enfrentam particularidades que os fazem sentir-se solitários. Diferente de outras culturas, onde a solidão pode ser ligada a relacionamentos insatisfatórios, na Coreia do Sul, muitos se sentem solitários quando percebem que não são dignos ou não têm um propósito na vida.
Além disso, a pressão social e a autoavaliação severa fazem com que muitos, especialmente entre as gerações mais jovens, sintam-se inadequados ou temerosos do fracasso. Esse cenário é reforçado por fatores como:
- Aumento de lares unipessoais.
- Declínio nas interações sociais fora do ambiente familiar.
- Influência negativa das mídias sociais.
- Cultura competitiva e voltada para resultados.
Esses aspectos contribuem para a sensação de solidão, mesmo em uma sociedade com redes sociais ativas e conexões aparentes.
Medidas e Comparações Internacionais
O governo sul-coreano já tomou algumas medidas para enfrentar a solidão, como a criação da Lei de Prevenção e Gestão da Morte Solitária, que visa compilar um plano abrangente para a questão. Em 2023, foram implementadas emendas que possibilitam apoio financeiro, após o reconhecimento da necessidade de auxílio a jovens reclusos.
A situação na Coreia do Sul é reflexo de uma tendência mundial. Outros países, como o Japão e o Reino Unido, também têm buscado abordagens para solucionar problemas similares, com iniciativas incluindo a nomeação de Ministros da Solidão e planos de ação que buscam expandir o suporte social. A Organização Mundial da Saúde reconheceu a solidão como uma “ameaça urgente à saúde”.
Contudo, especialistas alertam que simplesmente aumentar as conexões sociais não resolve a raiz do problema. É fundamental promover uma mudança na sociedade, permitindo que os indivíduos aprendam a lidar com a solidão e se posicionem de forma mais positiva em relação a si mesmos.